Como construir um espírito de equipa?
As unidades militares de elite são um exemplo perfeito de organizações ou grupos no qual o espírito de equipa é fundamental (trata-se, de facto, de uma questão de vida ou morte). Vamos por isso recorrer ao que a literatura especializada da área tem dito sobre este tema.
«Pequeno é lindo»
A pesquisa feita durante a Guerra da Coreia chegou à conclusão de que o tamanho ideal para um grupo de combate era o algarismo, de preferência em número entre 3 e 8, sendo que 5 foi considerada a dimensão ideal.
Isto acontece porque quando um grupo cresce demasiado a coesão interna do mesmo tende a diminuir acentuadamente. Isto fica a dever-se ao facto de a unidade ser tão grande que se torna impossível que todos os seus membros tenham contactos entre si e desenvolvam laços pessoais.
Na ausência destes laços pessoais de confiança, o grau de variação das atitudes e expectativas dentro do grupo tende a ser bastante grande, conferindo pouca homogeneidade ao grupo e, consequentemente, pouca coesão, o que se traduz numa certa “descoordenação”. Na realidade, quando um grupo é mais pequeno, o grau de homogeneidade é maior, e todos tendem a pensar do mesmo modo, o que elimina as tensões próprias de grupos maiores, em que uma parte do grupo pretende agir de um modo e outra parte de outro. O grupo pequeno tem por isso menos tensões internas e um grau de identificação entre os seus membros maior.
Os Marines, por exemplo, regem-se pela chamada “regra de três”, que significa que cada líder nunca tem mais do que três homens ou unidades sob a sua responsabilidade directa. O que isto significa, na prática, é que cada um sabe perfeitamente quais são as suas responsabilidade perante quem, o que cria uma relação apertada uns com os outros e uma dedicação para com a rede imediata de três. Já o SAS utiliza o chamado sistema “buddy-buddy” (parceiro-parceiro), em que cada homem é responsabilizado por proteger o parceiro e assumir o seu lugar caso seja necessário. O que isto significa é que cada homem sabe que há alguém a olhar por ele, criando um efeito psicológico de segurança.
Autodomínio
O autodomínio é outro elemento fundamental para o sucesso de um grupo, já que o comportamento em grupo tende a ser menos controlado que o comportamento individual. Assim, um grupo pode ser muito mais facilmente afectado por emoções fortes, como a raiva cega, do que um indivíduo isolado. Além disso, os grupos tendem a ser emocionalmente mais tensos e a permanecer assim durante mais tempo do que os indivíduos. Basta pensar que as atrocidades de guerra são quase sempre cometidas em grupo e muito raramente por indivíduos isolados.
A melhor forma de conferir a um grupo um elevado grau de autodomínio passa pelo treino recebido, que deve ser tão duro e realista quanto possível, não só para enrijecer os homens de um ponto de vista físico mas também psicológico, habituando-os a ligar com o stress e a violência, de modo a que estes se tornem parte normal do seu comportamento.
Sentido de comunhão
Mais uma vez, a pesquisa feita durante a Guerra da Coreia demonstrou que os grupos mais eficazes eram aqueles que apresentavam um elevado sentido de comunhão e identificação entre os seus membros e a unidade. Mas, como é natural, é impossível obrigar os homens a gostar uns dos outros. Esse sentido de comunhão só pode ser atingido através de várias experiências, rituais e comportamentos que as unidades de elite fomentam. Vejamos quais:
- Pertencer a uma elite
O sentimento de pertencer a uma elite, a uma tropa especial e diferente da tropa comum, é um poderoso elemento de identificação entre os membros da unidade de elite. Por forma a reforçar este sentimento de pertença, por um lado, e de diferenciação, por outro, são utilizados uniformes e insígnias especiais bem como expressões pejorativas para designar os outros. Os membros do Regimento Britânico de Pára-quedistas, por exemplo, referem-se a todos os outros regimentos como “crap hats” (chapéus de merda, em alusão às boinas caqui).

- Sobreviver ao treino
O treino de elite é extremamente duro e a simples experiência de partilhar as mesmas esperanças e suportar tribulações e dificuldades cria um laço muito forte entre os soldados. Além disso, a dureza do treino exclui, naturalmente, aqueles que não se adaptam e apresentam tendências anti-sociais prejudiciais ao grupo.
- Sobreviver ao combate
O combate, a experiência de enfrentar a morte em conjunto, cria também um laço muito forte entre os homens. São conhecidos casos de soldados que morrem a tentar recuperar os corpos de camaradas caídos, tal é o espírito de corpo que se estende para além da vida.
- Rituais
Finalmente, os rituais próprios dos corpos de elite proporcionam mais um elemento de coesão e identificação. São, a este respeito, especialmente relevantes as cerimónias de iniciação e o enterro dos mortos. As cerimónias, muitas vezes vistosas ou complexas, conferem à unidade um sentimento intenso de orgulho nas suas capacidades.
O membro da equipa de elite
Já vimos alguns dos elementos indispensáveis à construção de um forte espírito de equipa, só nos falta então ver quais as características típicas do membro da equipa de elite.
Primeiramente, o membro da equipa de elite não pode demonstrar características anti-sociais, falta de coragem, paranóia ou mitomania, já que estas características tendem a desmotivar e a repelir os restantes e a criar clivagens no moral e problemas de comunicação.
Pela positiva, chegou-se à conclusão de que os membros individuais do grupo deveriam possuir um quantidade significativa de características e experiências comuns. Além disso, um carácter aberto e afável, aliado a uma força mental capaz de resistir bem às adversidades é fundamental, já que este tipo de indivíduo tem o efeito benéfico de inspirar os outros à sua volta que, por sua vez, tentarão comportar-se à sua altura, imitando o seu comportamento. Outro factor que se descobriu ser relevante é a origem social (supostamente uma origem social comum implica a existência de uma “linguagem” comum sobre a vida e as experiências). Finalmente, um elevado grau de disciplina do tipo da caserna (alojamento limpo e arrumado, higiene pessoal, prontidão) parece também exprimir-se numa boa atitude de combate.
Nada de maçãs podres
Tudo o que vimos até agora pode resumir-se numa só ideia: nada de “maçãs podres”. O treino, os padrões de exigência, as dificuldades, etc., têm como consequência prática que quem não se adapta bem ao grupo não tem hipótese de chegar ao fim e fazer parte da equipa de elite. Maturidade, entrega, autodomínio, capacidade de sofrimento, vontade e persistência são características inerentes ao elemento de elite e tudo o que vimos até agora é concebido precisamente para refinar estas características naqueles que as possuem e excluir sem apelo nem agravo aqueles que se revelarem incapazes de as desenvolver.
Muito bom artigo e que deverá ser lido e relido por todos sem excepção.
Excelente artigo.