OTTO SKORZENY ENTREVISTADO PELO RIVAROL


OTTO SKORZENY ENTREVISTADO PELO RIVAROL

Do magnífico semanário francês RIVAROL vamos transcrever, com a devida vénia, a entrevista publicada no seu número de 24 de Março último, com o coronel Otto Skorzeny, o quase lendários libertador de Mussolini e autor de muitos outros extraordinários feitos.

In Agora, nº 268, pág. 3/4, 09.04.1966

“Tenho 1,95m de altura de manhã e um 1,94 à noite”, responde com humour o antigo coronel das Waffen SS cujos livros, hoje traduzidos para hebreu, estão inscritos no programa da Escola de Guerra em Israel. Mas o señor Skorzeny (madrileno de adopção) calunia-se. Com 57 anos, continua a ser aquele desportista completo cuja silhueta foi vista, em tempos idos, em todas as frentes. Entre duas viagens, entre dois encontros de negócios, joga ao ping-pong, nada, treina-se à pistola, instala-se nos comandos dos aviões.
Até à data, Otto Skorzeny nunca tinha concedido uma entrevista a um jornalista francês. O antigo oficial, que combateu na frente do Leste com os “Sete Alicerces da Sabedoria” do inglês T.E. Lawrence nas suas bagagens, não tinha contudo preconceitos contra o nosso país. Deu provas disso na semana passada. Respondendo com prazer a todas as nossas perguntas. No quadro dum aeroporto internacional que poderia ter sido o de Orly.


Treze duelos à arma branca

Rivarol – Na época, não muito antiga, em que o Intelligence Service via em V. Ex.ª “o homem mais perigoso da Europa”, jornalistas chamaram-lhe “Scarface” ou “o balafrado”. Mas as cicatrizes que tem na cara evocam em si recordações dos seus treze duelos de estudante. Que pensa hoje destes duelos à arma branca o homem de negócios de envergadura internacional que V. Ex.ª é presentemente?
Otto Skorzeny – Esta tradição foi muitas vezes falsamente interpretada no estrangeiro. Permita-me, pois, de romper algumas lanças em seu favor! Mesmo que esta maneira de concluir um assunto de honra não esteja actualizada com a época actual, a época dita moderna. Pois decerto, em França e em vários Estados da América do Sul, o duelo transformou-se agora numa farsa. Contudo, o hábito de concluir desta maneira graves assuntos de honra ainda é regularmente praticado, hoje em dia, pelo corpo de oficiais de certos países.
Foi em 1926, em Viena de Áustria, que me filiei numa associação de estudantes duelistas. Considerávamos então como um dever conceder voluntariamente e sem reserva uma satisfação, e de a exigir. O sabre de cavalaria, ligeiro, médio ou pesado, era a arma habitual destes duelos, mas nos casos particularmente graves, a escolha de pistola impunha-se. Eis porque, nós estudantes, bem como os jovens oficiais, sentíamo-nos obrigados a ter um comportamento sempre correcto. Com efeito, se algum de nós, possivelmente por causa duma bebida alcoólica, ofendesse em palavras ou em acção um outro estudante ou um oficial, devia logo responder por este facto a combater.
Rivarol – Na sua opinião, Sr. Skorzeny, o duelo sério, o “duelo de pé”, a esgrima constituía um excelente meio de educação. Poderia falar-nos dos “mensurs” usados há mais de um século, nas Escolas Superiores, na Alemanha, na Áustria e também em Praga, Zurich e Tchernowitz?
Otto Skorzeny – Estes “mensurs” entre estudantes, praticavam-se com espadas afiadas nos dois lados. A cabeça dos combatentes estava nua até ao pescoço; mas os olhos estavam protegidos por óculos. Nestes “mensurs”, evidentemente submetidos a regras, tratava-se antes de mais de dar provas de domínio do corpo e sobretudo dos nervos. Por exemplo, o duelista não devia evitar um golpe que via vir. Mesmo ferido por um violento golpe de espada na cabeça, o duelista não devia mexer e ainda menos soltar um grito de dor.
No meu tempo, este uso de assalto tinha o valor dum complemento de educação, que vinha muito naturalmente aumentar a educação que já devia ter sido dada no meio familiar. Pelo duelo, o jovem aprendia a responder pelos seus actos e pela prática de “mensurs”, habituava-se à firmeza sob a dor.
Rivarol – Pretende V. Ex.ª que em 1966 estes duros métodos de educação pelo duelo e os “mensurs” sejam indispensáveis.
Otto Skorzeny – Não, mas não conheço associações de estudantes que procurem por outros métodos obter os mesmos resultados. O desporto em si, e mesmo um desporto de combate como o boxe — de que fui um adepto entusiasta — só excepcionalmente, a meu ver, pode alcançar o mesmo resultado educativo.
Com efeito, os duelos e os “mensurs” criam um sentimento solidariedade entre os estudantes. Este sentido da solidariedade, este sentimento de pertencer a uma mesma comunidade de educação nunca desaparecem entre os antigos membros das confrarias de estudantes. Transportando o sentido, pode-se, parece-me explicar tudo isso por estas simples palavras: “o sangue cria uma ligação…”

Porque Rommel foi idolatrado pelos seus homens

Rivarol – V. Ex.ª foi o organizador dos comandos especiais da Waffen SS. Os historiadores sérios são unânimes: a epopeia que realizou aos 35 anos, libertando Mussolini, internado num hotel do Gran Sasso, a 2000 metros de altitude, ficará a operação de comando mais espectacular da segunda guerra mundial. Um certo número de pobres diabos esforçaram-se por fazê-lo passar por um “criminoso de guerra”. Contudo, em Setembro de 1947, no seu processo, foi o comandante inglês Yeo Thomas que veio testemunhar em seu favor. “Meus senhores, o coronel Skorzeny e os seus oficiais portaram-se sem em gentleman durante a guerra”, declarou ao tribunal o mais famoso dos oficiais do Intelligence Service que combateu na Resistência francesa.
Chego agora à minha pergunta: nos seus livros “Os comandos do Reich” e “Operações Secretas”, V. Ex.ª afirma que o soldado está sempre pronto a lutar quando tem confiança nos seus chefes. Isto implica um conceito do papel de chefe. Qual é este conceito?
Otto Skorzeny – Ser chefe não significa somente que uma instância superior nos deu o direito ao comando. Para merecer a estima dos seus homens, o chefe deve ser para eles um exemplo. Na guerra, e se tem tempo suficiente, o oficial superior deve fornecer aos seus mais próximos colaboradores motivos razoáveis às ordens que dá. Pois estes devem ter a convicção que o seu chefe nunca lhes dá ordens sem fundamento ou sem sentido. Desta maneira, nos momentos críticos, quando a situação exige a modificação súbita duma ordem já dada, os vossos subordinados obedecerão cegamente a uma nova ordem formulada em termos diferentes e que poderia parecer absurda e perigosa. Naturalmente, para gozar da plena confiança dos seus homens, o chefe deve ganhá-la debaixo do fogo.

Creio na grandeza de Estaline

Rivarol – V. Ex.ª escreveu nas suas Memórias que é necessários contudo, “embora tivesse sido nosso inimigo, reconhecer a grande de Estaline”. Estaline, com efeito, não abandonou Moscovo ameaçado pela marcha alemã. Terá sido esta a única razão do seu juízo?
Otto Skorzeny – Não, Estaline foi, sem dúvida, um grande chefe do seu povo. Nos tempos difíceis, e em particular durante o Inverno de 1941, não hesitou em fazer apelo ao nacionalismo russo, considerado até lá como maldito. Levou assim o povo russo e os seus soldados a incríveis epopeias. Por outro lado, a propaganda soviética soube durante a guerra fazer deste ditador, temido e invisível no seu Kremlin, o “pequeno pai Estaline”, que só queria o bem do seu povo e dos seus filhos.
Veja, e isto é verdadeiro para os russos, os alemães e os franceses, os soldados não podem a presença na frente do chefe supremo — o que, aliás, subtrai-lo-ia à sua própria tarefa de direcção. Porém, é necessário que os grandes chefes militares se dirijam pessoalmente à frente. Para se assegurarem eles próprios de que está tudo em ordem. Para se mostrarem aos oficiais de tropa e aos soldados. Para nunca perderem o contacto com as praças.
Este contacto constante e estreito com a tropa fez por exemplo que o general Guderian, o marechal Rommel, o marechal Kesselring, o coronel Rudel e outros ainda, foram os ídolos dos seus homens e que um culto lhes é votado pelos antigos combatentes alemães.
Rivarol – Durante vários meses, a França viveu um assunto criminal. Como sabe, as consequência do rapto de um leader marroquino provocaram a fuga perante as responsabilidades. Na sua maneira de ver, o chefe dos serviços especiais deve proteger, em todas as circunstâncias, os seus subordinados?
Otto Skorzeny – É natural que o chefe, e de modo especial o oficial, deve, em todas as circunstâncias, cobrir as acções dos seus subordinados. Seja quando ele deu ordem pessoal, seja quando se trata de iniciativas tomadas por eles, na medida em que são conformes com o espírito e a honra militares. A experiência demonstrou-me que, quando um subordinado está convencido que terá a protecção do seu chefe, dá sempre do melhor de si mesmo. Seja na frente ou no cumprimento de missões especiais.

O testemunho dum Coronel Waffen SS

Rivarol – 430.000 soldados, oficiais subalternos e oficiais superiores das Waffen SS — a metade dos efectivos — caíram sob o fogo inimigo ou foram considerados desaparecidos. Esta combatividade extraordinária, que nunca foi contestada, como pode explicá-la vinte e um anos após o fim da guerra?
Otto Skorzeny – Os soldados das Waffen SS — nos primeiros anos da guerra, pelo menos — eram todos voluntários. Depois, eram instruídos segundo princípios de selecção intelectual e corporal. Se, no plano militar, a sua instrução era de primeira ordem, também eram objecto duma formação profunda e excelente do ponto de vista ideológico. Há que acabar aqui com a lenda — esta formação ideológica não se referia de nenhuma maneira ao partido nazista ou à pessoa do Führer. Ela inspirava-se essencialmente no conceito de pátria alemã e da honra e fidelidades militares.
Esta formação ensinava-nos que devíamos servir a nossa pátria em todas as circunstâncias, com todas as nossas forças e toda a nossa vontade. Esta obrigação com respeito à comunidade germânica tinha sido estendida, durante a nossa formação, ao conceito duma maior Europa orientada sobre o Oeste, que podíamos servir indirectamente quando servíamos a Alemanha.
As ideias que nos inculcavam então — aquelas de honra, de fidelidade, de Pátria — considerávamo-las sagradas. Impunham automaticamente a nossa fidelidade do Führer, visto este ter sido escolhido e eleito democraticamente plea grande maioria da nação alemã.
Estou convencido, quanto a mim, que é no espírito do corpo, criado por esta formação ideológica, que está na origem da extraordinária disciplina e combatividade das Waffen SS. Pode ser interessante notar que, no seu livro “A Rússia em Guerra” (Stoch, ed.), o Sr. Werth assinala, em passagens, a notável coragem das Waffen SS. Como correspondente de guerra inglês, tendo permanecido na Rússia durante a segunda guerra mundial, o Sr. Werth descreveu a guerra germano-russa do ponto de vista soviético. É a razão pela qual as suas observações favoráveis sobre as Waffen SS são das que não se discutem.

Mussolini foi oúltimo dos romanos”?

Rivarol – Engenheiro em construções mecânicas e director de empresa, mobilizado como soldado de segunda classe em 1939, nada o predispunha a ser o coronel mais célebre da segunda guerra mundial. No entanto, em frente dos seus comandos especiais, realizou, com o menor número de perdas, uma série de golpes sensacionais, impensáveis para os oficiais que concebiam a guerra segundo as regras das suas escolas militares. Ainda hoje o seu nome evoca para o grande público aquele feito de armas excepcional que foi, quatro dias após a capitulação italiana, a libertação de Mussolini.
Conservamos em memória o epílogo da operação aerotransportada do Gran Sasso — a saída do Duce fez-se graças a um pequeno avião. V.Ex.ª que estava com Mussolini a bordo do Fieseler Storch que pilotava o capitão Gerlach. O avião lançou-se dum terreno improvisado. Caiu no precipício. Mas o piloto soube servir-se da velocidade da queda para trazer lentamente o seu aparelho à horizontal.
Foi nestas circunstâncias pouco comuns que fez então conhecimento com o Duce. V. Ex.ª não é generoso em cumprimentos. Contudo continua a pensar que Mussolin foi bem último dos romanos”. Porquê?
Otto Skorzeny – Após ter libertado o Duce, tive a ocasião de trocar algumas palavras com ele. A nossa entrevista foi forçosamente breve, mas tenho de afirmar que o sangue-frio de Mussolini, como o domínio dos seus nervos e a reacção imediata do seu instinto vital, provocaram em mim a mais forte impressão. Adolf Hitler tinha-me declarado que Mussolini era o seu maior amigo e era ele que o definia como o último dos romanos”. Após a minha rápida tomada de contacto com Mussolini, não tive outra possibilidade senão subscrever a este juízo. Esta expressão não deve ser considerara como um cumprimento. Era uma comparação exacta e justificada.
Mussolini sobressaía de entre o italiano médio, isto é da média do seu povo. E isso em inteligência e carácter. A tal ponto que se mostrava o igual dos antigos chefes do Império Romano e que podia assim testemunhar no Século XX a grandeza da Roma desaparecida.

A propósito da Internacional nazi

Rivarol – Há alguns anos, apareceu na Alemanha de Leste, um livro que tinha por título: “Procurem o Homem da Cicatriz”. E esse homem perigoso, evidentemente, era o senhor, Mr. Skorzeny. Nessa ocasião e em outras, não deram crédito algum aos seus protestos. Não se empresta senão aos ricos e, quer queira quer não, o senhor pertence já à mitologia contemporânea. Além disso, acontece que a sua fotografia na primeira página dos semanários faz subir a sua tiragem.
Episodicamente, por toda a parte, alguns jornalistas, que são ou os melhores dos mitómanos ou os piores dos escroques, vos identificam com o impulsionador da organização clandestina “A Aranha”. A acreditar neles, o senhor teria sabido habilmente fazer frutificar os capitais alemães depositados no estrangeiro. O senhor seria o homem, que “após a derrota da Alemanha” estaria misturado em todos os casos equívocos do renascimento do nazismo”. Do Cairo ao Rio, de Québec a Barcelona, e do Cabo e Saigão… Que pensa disto?
Otto Skorzeny – Se o adversário leal de ontem pode tornar-se meu amigo, em contrapartida nenhuma reconciliação é possível com o inimigo, cobarde e manhoso, que não conhece outras armas que não sejam a mentira e a difamação. No que me diz respeito, antes da guerra, na Áustria, eu já era engenheiro. Hoje, em Espanha, voltei a sê-lo.
Os jornalistas, que me atribuem o papel de chefe da Internacional nazi, parece-me pretenderem alcançar os objectivos. Uns querem criar dificuldades à Espanha, à Alemanha, aos antigos combatentes alemães. Outros esperam sobretudo extorquir dinheiro aos directores de jornais. Em 1964, contaram, em semanários franceses, que eu havia adquirido domínios na Irlanda para treinar ali comandos. E as actividades que me atribuíam consistiam em preparar conspirações contra os chefes de Estado.
Quanto a essas histórias de tesouros fascistas dissimulados pelo estrangeiro, não são mais do que lendas destinadas para o uso dos tolos. Nenhum dirigente nazi jamais teve tesouros à sua disposição. No que diz respeito a dinheiro, nunca dispusemos de mais do que o nosso soldo de soldados. Creia-me: se um ou outro desses fabulosos tesouros existisse, eu teria sido informado disso. Ora não se deu o caso…
De dois em dois anos, o monstro do Loch Ness é ressuscitado por jornalistas desejosos de fazer alguns “vinténs” suplementares. E, de dois em dois anos também, ressuscitam essa misteriosa organização a que chamaram “A Aranha” e da qual eu seria o chefe. Nestes últimos tempos, porém, as reaparições dessa magnífica “peta” tornaram-se mais frequentes.
Saiba, para sua informação, que essa organização chamada “A Aranha” nunca existiu. Ser-me-ia difícil ser o organizador de qualquer coisa que não existiu no passado, que não existe no presente, e nunca existirá provavelmente no futuro. Numa palavra: a Internacional nazi é um mito. Como o monstro de Loch Ness.

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